Solitário

O dedo não sabe nenhuma letra nova, o poema fica torto.
Cai de bêbado.
Enxota o beijo pra ser dado, e fica com a boca assim, sem estalo.
Conserva o dia no bolso da camisa, pálido.
Espera no ponto de ônibus a novidade, a liberdade ou a claridade.
Belisca o braço pra ver se é pesadelo, cansa e chuta transeuntes e baldes.
E o cachorrinho que gane assustado.
O dedo faz um calo, o peito faz um galo, ensimesmado perde a paciência com seu interlocutor calado.
A sopa esfria a falta de fome, na pia escorre a louça só.
Se a parede fosse, se o ralo fosse, se o doce fosse doce, mas nem assim...
Dorme porque cansa de estar acordado, acorda cansado de tanto sono sem sonho.
O coração ficando pedra, o sorriso escorrendo no ralo, sorrisos desmanchando nas paredes, entre manchas e teias de aranha, teias também nos cantos do sorriso confiscado.

a janela inútil pasma: eu que sou quadrada.

(poema engasgado na terceira estrofe. poeta frustrado. que bicho é esse que dá no peito, eu pergunto, doutor tem remédio...? pílulas são soluções perfeitas em caixinhas com nomes invariavelmente findos em ina e ol. as notas musicais são tão poucas... as letras são 26. na nossa língua. na nossa língua, que lembrança... as coisas que não se lembram estão sempre na ponta da língua... as coisas que se lembram estão presas na garganta. poema engasgado na terceira estrofe. ronrona um bicho estranho no peito, acho que é melancolia, se não for tosse.).

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