Feliz aniversário. A mensagem automática. Eu sentado de pijama na sacada. Pisca o semáforo na esquina. E o sujeito pendurado no telefone público, não sei quantos cartões já praticou no aparelho, ele tenta algo que devia ter sido tentado antes - parece pedir desculpas, parece chorar. Eu resolvo apenas observar. Hoje é meu aniversário.
Estava lendo um livro. Esqueci de atender o telefone 3 vezes. Esperei ver o número certo. Não vi. A felicitação fria chegou (tipo programa de fidelidade) – lembramos de seu dia.

(A mesma pessoa que roeu meu pescoço no mesmo dia, do mês passado.)

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Sentei-me nu no que tinha de vago do meu pensamento – otário. Eu já decidi deixar de ser romântico na véspera da virada do milênio.
O mundo não acabou, o meu algumas vezes e eu não aprendo.
As vésperas sempre me trazem vertigens – deitei a cabeça no seu peito a última vez que você veio. Depois de trincheiras, depois de armaduras, de ditaduras. De ataduras.

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Depois de fechar os olhos assopraria duas velas escolhendo meus melhores pedidos mas não houve velas.
(a cera do tempo é que escorre queimando o dedo).
Tentei queimar algumas fotos. Mas não soube odiar.
Então fui amar na sacada.
O sujeito continua no telefone. Ele se derrama. Uma rua suja se inunda do seu choro. Impassível o telefone público adormece. Ele parece tentar uma vez o que devia ter sido feito antes. Não há paz na nossa rua. Se eu rezasse rezaria pelo sujeito. 
Ou talvez lembrasse de pedir que não houvesse telefone público nessa esquina.

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Em um mês será inverno. Não sou triste, eu reflito – e espero a campainha como um cão que sabe que não. – enquanto isso finjo que sou um homem calmo porque meu pijama me traz.... sobriedade. Por dentro minha multidão se move em êxodo tentando um pouco de bom senso. Antes do inverno.

Por enquanto eu mordo um presságio na sacada.

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