Primavera
E ainda não sendo primavera, hoje eu sorri.
Porque havia um homem na banca de jornal observando as
letras de novidades e eu quis me juntar a ele, então sorri. Sorri porque à
minha frente ia uma menina, no colo do pai, vendo a rua indo embora. Sorri porque
pela loja de livros entravam réstias de sol. E porque o sapateiro procurava uma
ferramenta como se nada de novo no mundo.
Sorri porque os homens no bar discutiam o resultado de um
campeonato e as mulheres dividiam suas preocupações com o almoço. As crianças
voltavam da escola com anotações nos cadernos que os pais irão ler mais à
noite, e não estará frio. Voltavam da escola com suas tarefas interminadas, mãos sujas de cola,
papéis de bala e promessas.
Sorri com uma senhora que levava uma pequena carteira
colorida em uma das mãos, e a outra ajeitava com seriedade os cabelos – como se
festa.
Sorri porque a senhora que passou, lenta, calçando sandálias,
ao meu lado, lembrou-me minha mãe, que está caminhando lenta ao lado de outra
menina, em outra rua, mas com - talvez - o mesmo sorriso. Ela sempre sorri olhando as pessoas,
em seu passinho desequilibrado.
E ainda não sendo primavera, sorri com vitrine colorida, pequeno
bolinho de chuva no mostruário da confeitaria, sorri com confeitaria, com ponte
de pedra, com janela aberta.
E sorri porque ouvi uma música nova. Sorri porque ouvi uma
música velha.
Uma criança me sorriu solidariamente. Achou graça. Riu mais.
As igrejas estavam em seus lugares fazendo sombra, como os
caixas do supermercado registrando contas, como os sinais de trânsito parando
ou deixando ir. Como o céu estava azul. Sem nuvens. Eu sorri, parando ou
deixando ir.
Sorri até porque meus acordes errados ainda assim são meus.
Sorri porque nossos homens não partem mais para a guerra.
Embora, eles partam. Mas ainda nem é primavera.
Feliz por perceber que a primavera existe, ou melhor, ainda existe dentro dessa menina que, quando andava pelas ruas,ainda pequena(ela nem cresceu...) dizia bom dia ou boa tarde para quem passasse por ela causando admiração nas pessoas não acostumadas com tal agrado.
ResponderExcluirDeixa que a primavera floresça, todos os dias, muito embora digam que nem é primavera ainda...
Dani, eu amo essa poesia.
ResponderExcluirEstava aqui a revisitando,e nossa, sou grata por tê-la escrito. Sempre me emociono.
Como uma verdadeira poesia, ao lermos, ela nos lê.
Um abraço!