"trabalhando para o inimigo" - sin perder la ternura
Tem uma flor amarela que balança no dia cinza, como se
estivesse belo. Está belo.
Casacos passeiam na praça com seus motivos solenes.
Bicicletas ligeiramente dão ao ar um movimento de céu ou de
mar, com suas nuvens circulares.
Mal posso olhar para o céu. Uma moldura branco-gelo aprisiona
no tempo uma árvore desfolhada que ergue seus nervos, digna, honrando sua seiva, sua
raiz.
- Sai desse vento, menina. – o velho que passa lembra minha mãe.
O conselho pára na página do livro. A cidade se intromete no
meu projeto diário. A cidade me parte em duas, como o livro, aberto, que nesse
momento apoia minha espera por mais um dia da minha sina, pequena cela do outro
livro, livro-ponto e vontades proteladas deixadas na segunda gaveta para quando encerrar o expediente.
É triste o dia porque a doçura está arranhando meus pés
pedindo para correr. É triste porque as horas do dia – agora cinza – se tornarão
dígitos, carimbos, frases prontas para explicar os inexplicáveis débitos créditos dos dias que deviam ser apenas azuis.
Leio: “Tonterias”. É triste que eu tão tonta às vezes seja tão
sensata.
***
Mas em certos segundos meu coração batendo se perturba de um
querer indecente. Sorrir no meio da
manhã – torta, com seus monitores também cinza, mas de outro cinza sem
romantismo ou lirismo algum.
Morder a tarde que já angustiada morre informando na
monocromia do seu céu polido que acabo de perder mais um milagre. Espalho, com um criminoso sonho de
vento, tufão, ou onda gigante, a despedaçar os
papéis e os deferimentos, as normas de instrução.
Em letras grandes, como se bandeira: REVANCHE CONTRA O DESPERDÍCIO DA MINHA MÃO QUE NÃO ESTÁ ESCREVENDO POESIAS OU DISTRIBUINDO PÃO.
***
O dia lá fora parcela vida em diminutos momentos de pôr em postais, doces de abóbora-pão de queijo-pirulito de chocolate-violão.
Entristecido, quase choro, mais que choro - inundo. E molho os contratos, cartões e cláusulas
gerais.
Lá se vai a paz. Lá se vão os jornais. O espelho risca meu rosto de um letreiro urgente: a vida é pouca, e tamanha. E em silêncio eu torço contra os formulários.
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