Trechos de uma noite acabada

Muitas palavras escritas no silêncio de esperas. Enquanto aguardo e todos conversam – a humanidade – atrapalhada. Soletro: incredulidade.
Escolho que é bom ter um bloquinho uma boa caneta – páginas rabiscadas. Releio minhas anotações porque o tempo passa eu queria estar sorrindo mas todos tentam se atrasar e há muito passou o tempo que eu tinha tempo para gastar.
Irritada me folheio

tarefas de estagiária – desnorteada estagnada – de comunicação – incomunicável incurável – sangrando pela tinta azul lista para um dia coisas que não faço enquanto escrevo poesia e pesquiso outras formas de ser inútil com certa alegria anotações de uma aula a que não fui lista de livros a ler eu ainda acredito nestas leituras e escrituras mas agora eu uso olhos azuis e minha própria identidade

Antes fui um leão urrando um camaleão sem disfarces uma moça perdendo as chaves pegando chuvas e eternidades.
Uma menina no balanço lendo veríssimo, que eu sempre achei um nome exagerado.
E todo exagero é verdade.
Eu lembro de tudo e deixo no canto um sonho rubricado – possibilidade.
E seguem mais páginas riscadas, páginas riscadas.

Quando tudo termina e então já é tarde te encontro e te conto minhas purezas, como se a morrer. Porque estamos sempre quase sempre acordados e nos embebedamos e damos um ao outro cansaços para adormecer.
Eu queria que você desabotoasse minha blusa mas estávamos exaustos. Eu estava por querer não saber mais nada você queria não trabalhar ao amanhecer.

- amanhã eu vou pintar.

Eu que não entendi, ontem, amigo. Você sonhava. Agora eu queria te dar um abraço em que coubessem esses teus quadros imaginados.

****

Sonho que pergunto:
Quando as cores pararam?
Li que a arte explica o que a ciência não explica.
Céus, eu não entendi nada.
E talvez fosse preciso não estar tão amargurada.
Ontem eu comprei um doce e acreditei de novo, e quis cantarolar, e cantei, na calçada.
Quando lembro que queria te mandar um presente, uma boa notícia, falar que sei dançar tango, ou que o som que ouvi é demais, e acordo indignada.

***
Então você me conta essas novidades de sempre, e estas moedas que sobreviveram por sorte.
E fingimos um para o outro que não sonhamos, e contamos muito raras vezes no que acreditamos.

Desabotoa, bem, o que vai por baixo da blusa, embora estejamos cansados.
Desabotoa o que por baixo dessa minha brancura, descolorida envergonhada, tem.
Desabotoa, bem, que é poesia que eu respiro e estou afogada.

E isso é verdade também.

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