música sem música lado 1
eu nunca
fui a paris eu nunca fui ao comércio eu sou uma turista de gentes eu nunca nem
entro no mar mas eu vi seus olhos em mim certa vez e isso foi tudo o mais profundo possível
eu tenho um
violão e eu sou uma dançarina sem canção eu respiro e cada nota minha desafina
e arde eu não tenho música mas eu canto sempre
talvez não
de tarde e no meu bairro alguma igreja toca a ave-maria eu não toco nada mesmo
eu gostaria de tocar tambores eu não tenho som e eu grito que a cidade fica
triste
eu sou uma
poeta sem versos sem rimas e sem tiros mas eu já chorei rios e rios eu juro que
tudo que sinto é de verdade mas as editoras recusam meus originais
eu não sou
original eu sou igual aquele riso seu e dele e dela e eu também sou o moço que
vi hoje deitado debaixo do viaduto e eu me perguntei que sentido isso tudo faz
e não faz
eu nunca
entendi análise combinatória e não sou aleatória eu tenho alvos eu tenho calos
de tanto segurar nas mãos os espaços da minha memória e burilá-los em obras de
arte que não se concretizam
eu sou uma
dançarina sem sapatos sem compasso eu estou na corda bamba e tenho medos muito
medo de alturas mas eu não sei andar no chão
eu caio no
chão eu sou uma turista de gentes de quartos de lombadas de livros achados e
restos de cigarros e de janelas que me veem por dentro
e ventam em
meus cabelos que são como os de alguém que foge quando você parte desenha em
mim duas estradas em direções contrárias e eu quando vou é sempre,
quase
sempre, sem ida e sem volta.
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