Cidade em fabricação
Farejo
esquinas e cantos e becos em suspense num cio de metáforas. Me comove o que
fazem com o chão e as paredes na cidade. Em especial os que pouco podem sobre o
chão e entre paredes. Então eles gritam pelas paredes e pelos prédios
desenhados.
A cidade
fabrica suas dores e seus próprios remédios. A cidade fabrica a arte e a arte
fabrica cidade. A cidade, em especial o ambiente da metrópole, me causa
curiosidades e paixões. Me fabrica.
Gosto de
andar na noite nos passeios das feras. Os lugares de fomes e de sedes. Ali os
copos se derramam e as salivas e cheiros coloridos ácidos ou salgados – gosto –
enquanto em tudo o mais há sono e sonhos aqui não há paz. E isso é bom.
Há medo
também mas há um medo maior de inexistir – há essa necessidade de cravar unhas. De nosso caos.
A cidade
comunica, através de seus semáforos, anúncios luminosos, pixos e gritos de
ambulantes. A arte comunica, através de seus gritos, seus anúncios luminosos,
seus ambulantes – seus cidadãos perambulantes. Cada um gira um mundo sob os pés
sob os trilhos pra onde vai de onde vem em caminhos possíveis e impossíveis da
cidade.
A cidade
joga todas as verdades na minha cara enquanto eu passo com meu próprio passo já
sem saber quais são as minhas. O ônibus se desloca pela rua enquanto as
calçadas pixam minha cara e roem meus muros e mijam em meus sapatos. Eu me
desloco pela calçada sentindo cheiros e buscando sabores – em bares com
azulejos em seus mostradores com garrafas coloridas e ladrilhos e mesas onde se
salva a humanidade ou se finge se salvar.
No trânsito
de criaturas que buscam, no mundo em que todo mundo é deus.
Cidade em espera
das cidades
agora em certa paz momentânea de barulhos e pressas sobra a intempérie dos
medos e saudades por trás das fechaduras e janelas. todos que escondíamos medos
os medos penduramos nos varais das sacadas. em algumas vias públicas os que
ficam esquecidos e fazem barulhos e nós que passamos mascarados.
(no
carnaval nós brincamos e eu estupefata com a beleza do casario e as caras
sorridentes das pessoas com maçãs do rosto brilhantes e pulamos no meio da rua
cantando e nos abraçando. os carros eram proibidos e nós podíamos ficar enormes).
e faz
pouco, tão pouco tempo.
em pouco
tempo sairemos, e será até mais bonito. eu pegarei na sua mão para atravessar a
rua, que espera nossos barulhos. por ora, nos amemos por dentro.
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